domingo, 10 de abril de 2011

Do lixo ao luxo

Quando falar em reciclagem ainda era novidade, estes artistas já utilizavam materiais desprezados, como sobras de alumínio, papelão e plástico de pára-choques de automóveis. Hoje, os artesãos do lixo são reconhecidos por uma clientela que valoriza objetos produzidos sem agressões à natureza


As peças belíssimas que aparecem nesta reportagem, exibidas por seus criadores, foram fabricadas com materiais que estavam a caminho do lixo. Muito antes da maré ambientalista que hoje - felizmente - varre o planeta, esses artistas já levavam a sério a lei de Lavoisier, segundo a qual, na natureza, nada se cria e nada se perde: tudo se transforma. Desde o início da carreira, eles se propuseram a missão de resgatar das caçambas e dos latões produtos que demorariam décadas ou séculos para se decompor, criando com eles objetos de desejo.
De forma original e generosa, Bia Hajnal, Nido Campolongo e as irmãs Sara Rosenberg e Anete Ring utilizam a arte para mostrar as possibilidades dos recicláveis. Copos descartáveis viram luminárias, gigantescas caixas de papelão dão origem a mesas e cadeiras firmes e confortáveis e resíduos de alumínio industrial transformam-se em charmosos candelabros.
Obter resultados requintados depende de muita pesquisa, dedicação e, principalmente, criatividade. O desafio do design sustentável sempre foi tornar atraente um produto novo que pode causar estranheza. "Um banco de papelão não afunda se eu sentar?", por exemplo, era pergunta recorrente entre os clientes de Nido Campolongo. Aos poucos, porém, surge aconsciência da importância de consumir produtos ambientalmente corretos para gerar um planeta saudável.
Se antes essas peças eram vistas como alternativas de baixo custo, hoje são valorizadas, associam-se ao que há de mais moderno e não raro conquistam espaço no mercado externo. Além do design, existe uma preocupação em melhorar a utilização desses objetos. O Brasil desponta como um dos países que mais reciclam no mundo, mas falta muito para ter a alta tecnologia a serviço da reciclagem.
Por isso, com raras exceções, ainda não é possível produzir peças desse tipo em larga escala. Mas quem sabe? Talvez, em breve, nossa casa venha a ser inteiramente decorada com o luxo do lixo.
NIDO CAMPOLONGO - O ARTISTA DO PAPELÃOEle ainda era menino quando começou a trabalhar na tipografia do pai e conheceu as inúmeras possibilidades do papel. Isso levaria o paulistano Nido Campolongo, 52 anos, a tornar-se um dos mais respeitados designers que utilizam o papelão como matéria-prima. Aos
22 anos, ainda trabalhando com o pai, Nido entrou para a faculdade de engenharia. No meio do curso, fez aulas de desenho e de gravura em metal. "Com esses estudos ea experiência na tipografia, resolvi criar peças para empresas", conta.

Karine Basilio{txtalt}
Nido Campolongo, em sua poltrona de papelão
Entre os projetos estavam agendas, pastas e embalagens, produtos sofisticados que fariam a fama da empresa que Nido tem até hoje, a Galeria do Papel. A primeira sacola da grife Forum, por exemplo, foi criada por ele. "Eu me inspirava no conceito gráfico oriental", afirma. Com as sobras das próprias criações, em 1994 o artista plástico passou a costurar e a produzir mantas de papel. Para exibilas, passou a construir suportes, que mais tarde se transformariam em móveis belos e modernos.
Como o papelão vem da celulose, extraída da madeira, é possível produzir com ele peças firmes e duráveis. Nido, então, aprimorou sua técnica de marcenaria e criou prateleiras, cadeiras e mesas. Não parou por aí. Com resíduos da indústria e argila, inventou em seu ateliê em São Paulo "tijolos" de papelão para a construção de uma oca, exposta em 2001 no Sesc de Santo André.
O desejo de Nido agora é construir uma casa ecológica totalmente habitável. Montará ainda uma gigantesca espiral no Conjunto Nacional, na avenida Paulista, em São Paulo, com inauguração prevista para este mês. A instalação permanente terá como objetivo explicar as práticas relacionadas ao lixo na capital paulista.
Apesar do sucesso, ele lembra que o começo da carreira foi bem difícil. "Muitas vezes pensei em desistir", conta. Se hoje é chamado para decorar lugares elegantes, como restaurantes no Rio de Janeiro, lojas de design em Paris e Nova York e até mesmo cenários de teatro, é por que acreditou ser possível trazer o belo para o material reciclado.
SARA ROSENBERG E ANETE RING - AS IRMÃS-PRODÍGIO
Aos 7 anos, por insistência da família, a tímida Sara resolveu encarar um concurso de estátuas na areia, na praia do Guarujá (SP).














 

O plástico ficou ecológico

No tempo que você levará para ler esta reportagem, cerca de 50 000 sacolinhas plásticas serão consumidas no Brasil. A média nacional é de 1,5 milhão por hora. Embora representem pouco individualmente, os saquinhos de supermercado formam um volume enorme de lixo, que pode demorar vários séculos para se decompor no ambiente. Como reduzir o impacto causado pelo plástico na natureza é uma preocupação crescente. Por isso, ganham cada vez mais espaço as iniciativas de produzir plástico a partir de matérias-primas renováveis, como a cana- de-açúcar e o milho.

Universidades e empresas trabalham em projetos conjuntos para identificar novos materiais e formas de melhorar as aplicações dos plásticos de origem renovável. Existem várias linhas de pesquisa e produção, que geram produtos recicláveis e/ou biodegradáveis. Uma peça plástica que será usada por muitos anos, por exemplo, não precisa ser biodegradável, mas é importante que seja reciclável. Já uma sacola de supermercado, que provavelmente será usada para acondicionar lixo doméstico, deve ser biodegradável.

Nos laboratórios da Universidade Estadual de Londrina (UEL), no Paraná, os pesquisadores produzem plásticos a partir de amido de mandioca. Os estudos já são feitos há dez anos e nos últimos quatro eles passaram a incorporar também uma porcentagem de fibra de cana-de-açúcar. “Começamos a ver que havia dificuldades na produção porque a mistura não era adequada para o processo industrial”, diz Fábio Yamashita, professor do departamento de Ciência e Tecnologia de Alimentos da UEL. Mais recentemente, os pesquisadores decidiram misturar o amido de mandioca a um polímero fabricado pela Basf ainda com origem petroquímica, o Ecoflex. O resultado foi um produto com algumas das características de que a indústria precisa.

Com a mistura foi possível testar o uso do plástico biodegradável em atividades no campo. Os principais usos até agora foram para a cobertura de campos para a plantação de morango, o ensacamento de goiabas na fase de crescimento, para evitar o ataque de pragas, e a embalagem de mudas de plantas medicinais, em saquinhos que geralmente são retirados antes do plantio. Os testes nos campos de morango foram feitos em escala commercial e mostraram que é preciso calibrar a velocidade de degradação do filme plástico. “Ele começou a se deteriorar antes do tempo”, afirma Yamashita. Na Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), no interior paulista, há estudos na mesma linha. A engenheira de materiais Marília Motomura trabalhou com amido de mandioca, fibra de coco e serragem de madeira. Ela misturou as matérias-primas ao Ecoflex para ampliar as opções de uso do plástico biodegradável, que pode ficar mais rígido ou flexível, por exemplo. Essas características são fundamentais para determinar que tipo de produto final é possível produzir. “A aplicação ainda é restrita. Apenas as peças feitas por processo de extrusão já estão sendo vendidas”, diz Marília.









                                              




A INDÚSTRIA INVESTE PESADO
Diante da demanda global por attitudes mais verdes, as empresas precisaram se munir de alternativas para oferecer ao mercado. A Braskem, oitava maior petroquímica do mundo, abriu em setembro do ano passado sua primeira filial destinada a produzir apenas plástico verde. A fábrica, que fica em Triunfo, no Rio Grande do Sul, recebeu 500 milhões de reais de investimento e tem capacidade de produzir 200 000 toneladas anuais de plástico verde. A estratégia adotada pela Braskem é usar etanol como matéria-prima.




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